quarta-feira, 15 de agosto de 2012

    PARA ENTENDER MELHOR A FLAUTA MÁGICA
(Publicado no programa do Festival de Ópera 2002 do Theatro da Paz em Belém)  
A Flauta Mágica é uma ópera que fala do amor. Sua mensagem é ao mesmo 
tempo simples e profunda. Um casal que  se ama só atinge o estado ideal de 
comunhão de almas quando os dois trabalham juntos na superação de inúmeras 
dificuldades que a vida lhes coloca, fortalecidos pela virtude e pela confiança. Sob 
esse aspecto, é uma fábula sobre o amor espiritual, puro e sereno, cuja moral foi tão 
bem aceita e assimilada em sua estréia (1791) quanto o é hoje. 
Existe porém um outro aspecto que, embora facilmente percebido pelo público 
vienense da ocasião, hoje nos escaparia totalmente, se uma série de estudiosos não 
tivesse, ao longo do tempo, analisado a  ópera em detalhes  e publicado suas 
observações.  
A Flauta Mágica  é repleta de símbolos e alegorias relativos à Maçonaria, da 
qual faziam parte tanto Emmanuel Schikaneder, o autor do texto da ópera, quanto seu 
compositor, Mozart, que viria a falecer apenas dois meses depois da estréia, e que 
havia encontrado grande conforto espiritual no seio daquela fraternidade em seus 
últimos anos.  
 O número três, muito importante tanto na filosofia quanto nos ritos maçônicos, 
é citado com freqüência no texto e na música. São três as damas que salvam Tamino 
do dragão, e três são os meninos que o conduzem às três portas dos três templos, o da 
Razão, o da Sabedoria e o da Natureza. A nona cena do primeiro ato tem como 
personagens três escravos de Monostatos. No início do segundo ato, Sarastro 
responde a três sacerdotes sobre a iminente prova de Tamino, enumerando três 
atributos do jovem: Virtude (Tugend), Discrição (Verschwiegenheit) e Caridade 
(Wohltätig). O diálogo seguinte, entre Sarastro e o Orador do Templo, é interrompido 
por três toques de trompa, cada um deles constituído de três acordes iguais. Estes três 
acordes, que já tinham sido ouvidos no início da abertura da ópera, representam as 
três batidas rituais com as quais o aspirante a maçom pede para ser admitido na Loja. 
Sua tonalidade é mi bemol maior, que se indica na partitura grafando-se três bemóis ao lado da clave. Essa simbólica tonalidade aparecerá em muitos outros lugares da 
ópera. Ainda quando Tamino e Papageno são levados ao templo para aguardar as 
provas, a percussão executa uma série de três trovões, que se  misturam às vozes. 
 Também o número dezoito, múltiplo de três, que dentro da hierarquia maçom 
equivale a um dos importantes Graus Capitulares, o de Soberano Príncipe Rosa-Cruz, 
aparecerá várias vezes. Sarastro faz sua  primeira aparição na ópera durante a 18
a

cena do primeiro ato. O libreto original observa que o cenário do início do segundo 
ato deve apresentar dezoito cadeiras onde se sentarão dezoito sacerdotes. O hino O
Isis und Osiris, welche Wonne (Oh Isis e Osíris, que alegria) entoado mais adiante 
pelos sacerdotes, tem dezoito compassos, e abre a 18
a
. cena do segundo ato. E 
Papagena, que aparece inicialmente como uma mulher muito velha, arranca risadas 
da platéia quando diz a Papageno ter apenas dezoito anos. O Grau Rosa-Cruz é citado 
indiretamente ainda quando os três meninos, ao trazer de volta a flauta mágica e o 
carrilhão, entram em cena, segundo o libreto, numa plataforma voadora coberta de 
rosas. O lema daquele grau hierárquico, Virtude e Silêncio, enumera as qualidades 
exigidas de Tamino antes do início das provas. 
 Um outro aspecto alegórico importante é que os principais personagens de A 
Flauta Mágica representam, metaforicamente, personalidades ou instituições da vida 
real. 
 A perversa Rainha da Noite teria sido inspirada pela Imperatriz Maria Teresa, 
cujo governo de cunho absolutista, simbolizado pelas trevas que acompanham a 
personagem, proibiu a existência da Maçonaria. O belo príncipe Tamino seria na 
verdade José II, o filho de Maria Teresa que a sucedeu no trono. Seu governo foi 
muito mais liberal do que o da mãe, e  permitiu que as assembléias maçônicas 
voltassem a se reunir. A doce Pamina representaria a Áustria, que o iluminado 
Tamino/José II liberta das trevas e traz para a luz da verdade maçônica com o auxílio 
do grão-sacerdote Sarastro, personagem  inspirado no geólogo Ignaz von Born, o 
respeitadíssimo líder da Loja  A Verdadeira Harmonia, uma das mais importantes 
agremiações maçônicas austríacas. Para que não restem dúvidas, o texto da segunda 
ária de Sarastro, In diesen heil’gen Hallen (Nestes sagrados recintos), é a reprodução dos altos ideais da maçonaria. Papageno, por sua vez, encarna o bom e simples 
camponês, o homem comum, com seus valores autênticos, cujas preocupações são 
encontrar uma boa esposa, constituir família e contar sempre com a tranqüilidade de 
uma mesa farta. Finalmente, o mouro Monostatos tem sido interpretado como uma 
sátira aos jesuítas, que se trajavam de negro e cuja ordem se opôs à maçonaria com 
todas suas forças. 
 Embora alguns livros sobre ópera afirmem que a ópera se passe no Egito da 
antiguidade -  país onde se acredita que a maçonaria tenha  nascido - , nenhuma 
referência no libreto nos permite tomar esta afirmação como absolutamente correta. É 
preferível, então, imaginarmos que a ambientação de  A Flauta Mágica  se  dá  num 
distante país oriental, nos tempos da antiguidade. 
A FLAUTA MÁGICA ‐ SINOPSE
ATO I:
Uma planície selvagem. O garboso príncipe Tamino entra correndo, perseguido por uma enorme 
serpente. Assustado e exausto, ele desmaia, e quando o monstro está para atacá-lo, surgem as três Damas da 
Rainha da Noite e matam a serpente com suas lanças. Acham o jovem muito bonito, e cada uma delas quer 
ficar só, esperando que ele acorde, enquanto as outras  duas vão avisar a rainha. Como não chegam a um 
acordo, resolvem ir as três juntas. 
 Tamino desperta, sem entender como a serpente jaz morta a seu lado. Chega Papageno, o alegre 
passarinheiro da rainha, cujo corpo é coberto por uma penugem parecida com a dos pássaros que captura e 
leva para embelezar o palácio, recebendo em troca vinho e comida. Papageno é todo simplicidade, e vive 
sonhando em encontrar a esposa ideal. Quando Tamino lhe diz que é um príncipe, filho de um soberano 
poderoso que reina sobre muitas terras, Papageno, fica muito espantado, pois não sabia que existiam outros 
países além do seu. Tamino então lhe agradece por ter matado a serpente, e Papageno, orgulhoso por passar 
por herói, não conta a verdade. 
 As Três Damas retornam, e castigam Papageno , dando-lhe água e pedras em vez de vinho e bolos, e 
colocando-lhe um cadeado na boca para impedí-lo de falar mais mentiras. A seguir, mostram a Tamino o 
retrato da linda Pamina, a filha da Rainha da Noite. O príncipe se apaixona imediatamente. Nesse instante, a 
rainha faz sua entrada triunfal. Ela conta a Tamino que Pamina foi aprisionada pelo malvado sacerdote 
Sarastro. Antes de desaparecer, a rainha promete ao príncipe que se ele salvar sua filha, Pamina se casará 
com ele. 
 As Três Damas removem o cadeado da boca de Papageno, ordenando-lhe acompanhar Tamino em 
sua missão de resgate. Tamino recebe das mãos das  damas uma flauta dourada, e Papageno um carrilhão dotado de muitos sininhos. Ambos instrumentos são mágicos, e os protegerão na jornada. Seus guias serão 
três meninos. 
 A cena muda para uma sala ricamente mobiliada, onde três escravos comentam que Pamina ludibriou 
Monostatos, o servo mouro de Sarastro, e conseguiu fugir. Ouve-se a voz de Monostatos, pedindo umas 
correntes para prender Pamina, que ele acaba de recapturar. Os escravos saem, e o mouro, que insiste em 
conquistar o amor da princesa, a traz para dentro. Nesse instante surge Papageno, que encara Monostatos. 
Cada um deles fica tão apavorado com o aspecto do outro que ambos fogem correndo. Mas Papageno volta, 
e diz a Pamina porque veio até ali, explicando os detalhes da missão de Tamino, enamorado por ela desde 
que viu seu retrato. 
 Tamino é conduzido até a entrada dos Templos da Razão, Sabedoria e Natureza pelos três meninos, 
que lhe recomendam manter firmeza e paciência. Tamino tenta entrar nos Templos da Razão e da Natureza, 
mas vozes internas ordenam que ele se afaste. Ao bater à porta do Templo da Sabedoria, surge o Orador do 
Templo, que conta ao jovem príncipe como a Rainha da Noite o enganou. Sarastro não é nenhum demônio 
malvado, mas  o venerando soberano do Templo da Sabedoria. O Orador, impedido por um juramento, nada 
mais pode explicar e vai embora. Misteriosas vozes informam a Tamino que Pamina está a salvo, e que logo 
ele terá a oportunidade de adquirir sabedoria. 
 Na esperança que Pamina e Papageno o ouçam, Tamino toca a flauta mágica. Animais de todas as 
espécies, enfeitiçados pelo som da flauta, saem de suas tocas para ouvir a música. Quando Tamino para de 
tocar, os animais vão embora. À distância, Papageno responde, tocando sua flauta de Pã. Tamino, sai para 
procurar Papageno, mas vai na direção contrária. Pamina e Papageno entram e são presos por Monostatos e 
seus seqüazes, que vieram em seu encalço. Subitamente, Papageno lembra-se de seu carrilhão mágico e põese a tocá-lo. O efeito é supreendente: o mouro e seus asseclas, enfeitiçados, não conseguem parar de dançar.  
 Em solene desfile, entram agora os sacerdotes, precedendo o carro de Sarastro, puxado por seis 
leões. Pamina, aterrorizada, implora o perdão do sacerdote por ter tentado escapar, explicando não mais 
suportar as investidas de Monostatos. Tamino volta à cena, encontrando Pamina pela primeira vez. Caem nos 
braços um do outro, docemente apaixonados, enquanto Monostatos espuma de raiva. Sarastro manda castigar 
o mouro com 77 chibatadas nas solas dos pés, e depois abençoa o jovem casal. A seguir, manda levar 
Papageno e Tamino para o interior do Templo da Sabedoria. Ambos devem ser preparados para as provas de 
purificação. O coro dos seguidores de Sarastro entoa  um hino final que fala dos elevados ideais que 
transformarão a terra num paraíso. 
ATO II:
 Um bosque sagrado. Os sacerdotes entram em austera procissão, e Sarastro lhes informa que Tamino 
deseja fazer parte da irmandade. Foram os deuses, explica ele, a determinar que Tamino deveria procurar 
Pamina, e por isso mandou raptar a princesa, subtraindo-a à guarda da mãe. Dois sacerdotes são escolhidos 
para instruir Tamino e Papageno sobre o ritual que os espera. Em seguida, todos elevam uma oração aos 
deuses Isis e Osíris.  Cai a noite sobre o pátio do templo, para onde os Dois Sacerdotes trazem Tamino e Papageno, que 
morre de medo do escuro. Os sacerdotes perguntam aos dois se estão preparados para enfrentar as provas de 
iniciação. A resposta é afirmativa, embora Papageno não pareça tão convincente quanto Tamino. Eles 
aceitam então um voto de silêncio, que Papageno custará a manter. Após a saída dos sacerdotes, surgem as 
Três Damas, instruídas para fazer com que os dois  companheiros voltem a obedecer a Rainha da Noite; 
vozes do Templo, entretanto, ameaçam as Damas com o fogo do inferno, e elas fogem muito assustadas sem 
nada conseguir. 
 Num jardim, Pamina dorme. Monostatos, ao vê-la, executa uma dança lúbrica ao seu redor, enquanto 
afirma que ninguém o ama por causa da cor de sua pele. Quando vai tentar beijar Pamina, ouve-se um trovão 
e surge a Rainha da Noite, furiosa, e ordena rispidamente ao mouro que se afaste. Pamina acorda, sua mãe 
diz que foi traída e dá à filha um punhal, instruindo-a a matar Sarastro e trazer para ela o ornato do Círculo 
Solar das Sete Dobras que o Grão-Sacerdote usa no peito. Quando a Rainha desaparece, Pamina diz a si 
própria que não pode matar Sarastro. Num salto, Monostatos arranca o punhal de Pamina e tenta chantageá-
la: se ela não aceitar seu amor, o mouro a denunciará como assassina. A chegada de Sarastro põe o mouro a 
correr. Pamina pede piedade para sua mãe e o Sacerdote a acalma, dizendo que dentro das sagradas paredes 
do Templo não existe lugar para a vingança. 
 Na cena seguinte, os Dois Sacerdotes conduzem Papageno e Tamino para um recinto do Templo. 
Ignorando os votos de silêncio, apesar dos sinais reprovadores de Tamino, Papageno fala em voz alta o 
tempo todo. Quando ele pede algo para beber, entra uma mulher muito velha, trazendo-lhe um copo de água. 
Na animada conversa que se segue, a velhota diz que  tem apenas dezoito anos e que é a namorada que 
Papageno sempre procurou. Antes que ela possa dizer seu nome, ouve-se um trovão e a velha foge. Surgem 
os três meninos, trazendo a flauta e o carrilhão mágicos, e,  para grande alegria de Papageno, uma mesa 
coberta de iguarias e bebidas. Enquanto o passarinheiro mergulha na comida,  Tamino toca a flauta, atraindo 
Pamina, feliz por reencontrar seu amado. Mas Tamino, mantendo o voto de silêncio, não lhe dirige a palavra, 
e a moça parte agoniada, acreditando que ele não mais a ama. O trombone soa três vezes. É o sinal que as 
provas de Papageno e Tamino vão começar. 
 Na cripta da pirâmide, os sacerdotes agradecem a Isis e a Osíris por considerar Tamino digno de sua 
fraternidade. Antes do início das provas de Tamino, Sarastro traz a triste Pamina para despedir-se dele, e 
todos partem em seguida. 
 Papageno agora é testado, sendo cercado pelo fogo. Após observar sua reação, o Orador do Templo 
lhe diz que infelizmente, ele não foi aceito entre os iniciados. Aliviado, Papageno comenta que do que mais 
ele gostaria agora seria um bom copo de vinho. Após ter seu desejo atendido, ele volta a sonhar com uma 
boa e afetuosa esposinha. É quando aparece novamente a velhota. Papageno deve escolher entre tornar-se seu 
noivo ou passar o resto da vida na prisão a pão e água. Sem opção, Papageno concorda em casar-se com ela, 
e a velha se tranforma, num passe de mágica, numa lindíssima jovem chamada...Papagena ! Mas a alegria de 
Papageno dura pouco. Os sacerdotes a expulsam, pois o passarinheiro ainda não está pronto para ela.  Num pequeno jardim, enquanto esperam o amanhecer, os três meninos se deparam com Pamina 
desesperada, preparando para suicidar-se com o punhal que a mãe lhe dera. Reconfortando-a, os meninos 
fazem-na desistir desse ato impensado, assegurando-lhe que Tamino a ama profundamente.  
 Enquanto isso, Tamino, descalço, espera que dois guardas de armadura o preparem para as provas de 
purificação do fogo e da água. Ouve-se a voz de Pamina: ela vem acompanhá-lo nas provas. O voto de 
silêncio pode ser agora rompido, e os dois manifestam seu amor. Abraçado a Tamina, o príncipe toca a flauta 
mágica para afastar a angústia e o sofrimento, e os dois, lado a lado, galhardamente, superam ambas as 
provas. 
 Nesse meio tempo, o pobre Papageno anseia  por sua Papagena. Vendo desaparecer sua última 
chance de felicidade, pensa em enforcar-se. Mas os três meninos, vigilantes, sugerem que ele use seu mágico 
carrilhão para atrair sua amada. O estratagema funciona, e finalmente, Papageno poderá ser feliz ao lado da 
esposa pela qual esperou a vida toda. 
 A Rainha da Noite, acompanhada das Três Damas  e de Monostatos, preparam-se para tentar um 
último ataque contra o Templo, mas intensos raios e trovões os derrotam definitivamente. O sábio e bondoso 
Sarastro saúda a vitória da luz contra as trevas. O Bem venceu o Mal, e a ópera termina com um coro de sacerdotes agradecendo aos deuses. 
Lucas C. e Victor M.

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